[1.30] Escalada de guerra no terreno, de Kharkiv a Rafah, e na diplomacia, de Bruxelas a Washington
Os sinais de uma escalada do movimento bélico global aumentam de volume e de frequência. A UE quer revitalizar o Triângulo de Weimar para reforçar a defesa. A NATO teve um recorde de investimento.
Quando olhei para o conjunto das notícias sobre as várias frentes de batalha, no terreno como na diplomacia, fiquei impressionado. A palavra “guerra” é cada vez mais presente em todo o lado, condicionando a narrativa pública e os recursos diplomáticos e políticos. Ao pé disto, a campanha eleitoral para as legislativas e até a questão da cedência (prematura) da União aos agricultores, nem parecem importantes. Mas são.
ATUALIDADE
Escalada de guerra no terreno, de Kharkiv a Rafah, e na diplomacia, de Bruxelas a Washington
O Secretário-Geral das Nações Unidas, António Guterres, deu uma entrevista a anteceder a sua intervenção na Conferência de Segurança de Munique, esta semana, na qual alertou para uma divisão sem precedentes e três grandes ameaças existenciais no mundo: a guerra na Ucrânia e o consequente retorno da ameaça nuclear, as alterações climáticas e o desenvolvimento descontrolado da inteligência artificial. Guterres enfatizou a necessidade de enfrentar esses desafios de forma conjunta, apesar das crescentes divisões que paralisam o Conselho de Segurança da ONU.
Num contexto de crescente instabilidade, Guterres sublinhou crises adicionais, tais como ataques dos Huthis no Mar Vermelho, o massacre no Sudão, o caos no Sahel, a invasão russa na Ucrânia, e o conflito entre Israel e o Hamas que resultou numa devastadora operação militar israelita em Gaza. A sua mensagem principal foi um apelo urgente à paz, numa altura em que o mundo se depara com desafios sem precedentes e uma divisão acentuada.
Não é caso para menos. De Moscovo a Washington, de Bruxelas ao Cairo, de Varsóvia a Paris, de Telavive a Kharkiv, a diplomacia está cada vez mais tensa, seguindo os reforços dos investimentos em armamento e os anúncios de novas fases de maior intensidade nas duas principais guerras: na Ucrânia os combates aumentaram dos dois lados do conflito, na Palestina Israel avança em direção à fronteira com o Egito.
As notícias não param, tornando difícil o acompanhamento da situação. Abaixo fica uma
Síntese dos últimos dias
Crises na Ucrânia, em Israel e noutras regiões evidenciam um mundo cada vez mais dividido.
Líderes de França, Alemanha e Polónia discutem defesa após comentários de Trump. Revitalização do Triângulo de Weimar visa maior auto-suficiência da Europa na defesa, mas especialistas questionam a sua capacidade perante desafios futuros.
O ministro da Defesa alemão, Boris Pistorius, pediu aos seus aliados que façam o trabalho de casa.
Dezoito dos 31 Estados-membros da NATO vão atingir a meta de investimento de 2% do PIB em defesa este ano. O secretário-geral da NATO, Jens Stoltenberg, anunciou este recorde, destacando um aumento significativo face há uma década, quando apenas três países atingiam a meta.
As forças armadas da Ucrânia anunciaram que um ataque com drones navais "destruiu" o navio de desembarque Caesar Kunikov, enquanto o novo chefe militar do país visitava as linhas de frente, descrevendo a situação como "complexa".
Ataques de drones e bombardeamentos russos mataram pelo menos 10 pessoas em partes orientais, centrais e do norte da Ucrânia, incluindo três num mercado na região nordeste de Kharkiv.
A Suécia espera que o Parlamento húngaro ratifique a sua adesão à NATO durante a sua próxima sessão, que se inicia no final deste mês.
Um ataque de mísseis e drones na cidade ucraniana de Dnipro danificou uma central eléctrica, levando as autoridades a fechar escolas e evacuar um hospital. A força aérea da Ucrânia reportou ter derrubado 16 de 23 drones.
A UNESCO declarou que a invasão da Ucrânia pela Rússia causou danos estimados em cerca de $3.5 mil milhões ao património e locais culturais do país, com aproximadamente 5.000 destruídos.
Os gastos globais com defesa aumentaram 9%, alcançando um recorde de $2.2 biliões no ano passado, segundo o relatório anual The Military Balance do International Institute for Strategic Studies (IISS), prevendo-se um aumento adicional em 2024.
O relatório indicou que a Rússia perdeu cerca de 3.000 tanques de guerra principais durante os combates na Ucrânia, aproximadamente o mesmo número que possuía no inventário ativo antes de iniciar a sua invasão em grande escala há dois anos. A Rússia está agora a reequipar tanques antigos para uso.
Mike Johnson, o speaker Republicano da Câmara dos Representantes dos Estados Unidos, bloqueou a ajuda de guerra para a Ucrânia, ignorando o apelo do Presidente Joe Biden de que a aprovação do projeto de lei era vital para enfrentar o "ditador russo" Vladimir Putin. Johnson, próximo do candidato presidencial Donald Trump, declarou aos repórteres não ter qualquer intenção de permitir sequer uma votação sobre o projeto de lei, que havia sido aprovado no Senado.
O anúncio ocorre após críticas de Donald Trump à Aliança Atlântica por alegada insuficiência de financiamento por parte de seus membros.
Mediadores internacionais estão a aumentar os esforços para negociar uma trégua entre Israel e o Hamas, na esperança de evitar o assalto israelita a Rafah, na Faixa de Gaza já muito perto da fronteira com o Egito.
Desde terça-feira, o Egito tem sido palco de conversações entre representantes dos Estados Unidos e do Qatar sobre a trégua que inclua a libertação de reféns.
Emmanuel Macron comunicou a Benjamin Netanyahu que as operações israelitas em Gaza devem cessar devido ao intolerável custo humano e à situação humanitária. Macron enfatizou a urgência de um acordo de cessar-fogo para garantir a proteção dos civis e facilitar o acesso massivo de ajuda humanitária, apelando à abertura de rotas, incluindo o porto de Ashdod.
Espanha e Irlanda pediram à Comissão Europeia que investigue com urgência se Israel está a respeitar os direitos humanos em Gaza, destacando a crítica situação em Rafah.
O Presidente da Autoridade Palestina, Mahmoud Abbas, instou o Hamas a chegar rapidamente a um acordo com Israel para evitar mais desastres, evocando a necessidade de responsabilidade na obtenção deste acordo.
A Organização Mundial da Saúde declarou que os hospitais em Gaza estão totalmente sobrecarregados, indicando que menos de metade das missões de ajuda foram autorizadas.
Famílias de reféns preparam-se para apresentar queixa contra o Hamas no Tribunal Penal Internacional por crimes contra a humanidade.
Biden pede a Netanyahu segurança de 1,3 milhões de palestinianos em Rafah.
A Coreia do Norte voltou a lançar vários mísseis de cruzeiro em direção ao mar do Japão, a sexta vez que Pyongyang testa armamento desde janeiro.
Fontes: Le Monde, Die Zeit, Euractiv, RTP, Al Jazeera
FALTAM 25 DIAS PARA AS LEGISLATIVAS 2024
Nova semana, nova sondagem. Tudo mais ou menos na mesma: AD e PS trocam posições mas a distância entre ambos continua muito ténue e dentro da margem de erro, o CH cresce um pouco, tal como a IL. Os partidos de esquerda perderam terreno e é improvável que voltem a ter uma maioria parlamentar, apesar do ainda elevado número de indecisos.
Entretanto, a AD anunciou o cancelamento da agenda de Montenegro desta quarta e quinta-feira por motivos pessoais (a morte de um familiar próximo). Agora, há mais um dia em que a agenda do líder social-democrata foi cancelada: sexta-feira. O debate com Rui Rocha, na SIC, realiza-se no domingo às 20:45.
Quadro atualizado com a sondagem da Intercampus:
OPINIÕES
Pedro Filipe Soares critica o recorrente apelo ao voto útil nas eleições, argumentando que este mina as verdadeiras intenções democráticas. No Expresso.
Pedro Norton reflete sobre a posição de Luís Montenegro na política portuguesa, tendo passado a candidato a PM depois de ter partido como um "cadáver político adiado" cujo futuro era desde sempre limitado pelos seus próprios aliados. No Público.
Filipe Luís aborda o dilema estratégico entre Luís Montenegro e André Ventura perante os possíveis resultados eleitorais, destacando a falta de respostas claras aos desafios políticos iminentes. Na Visão.
🇪🇺🌾 Reforma da Política Agrícola Comum gera tensão na UE
Agricultores enfrentam desafios complexos e pressionam por mudanças nas políticas da UE
O poder dos agricultores é desmesurado: o setor emprega apenas 4% da população ativa
Os agricultores da União Europeia estão imersos numa série de desafios, apelidados pelo primeiro-ministro belga, Alexander De Croo, de “lasanha” de problemas. Estes incluem preços voláteis, custos elevados, legislação complicada e concorrência desleal. A reforma da Política Agrícola Comum (PAC) da UE, com um orçamento anual próximo de €60 mil milhões, intensificou o fardo sobre o setor, que representa cerca de 4% da população ativa da União.
Os protestos dos trabalhadores agrícolas têm levado a reações rápidas, por vezes vistas como precipitadas, por parte dos políticos em Bruxelas e em diversas instituições da UE. Em resposta às manifestações, a Comissão Europeia concedeu aos agricultores uma isenção temporária de regras que exigem a reserva de terras para conservação da natureza e reverteu parcialmente uma decisão de 2021 que permitia livre acesso para importações agrícolas da Ucrânia – que aumentaram de €7 mil milhões para €13 mil milhões em 2022, gerando excedentes e pressionando os preços em vários países da Europa Oriental.
Nesta semana, os agricultores alcançaram uma significativa vitória: sob pressão de líderes da UE e do seu próprio grupo político conservador, a Presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, retirou partes do seu ambicioso Green Deal. Anunciou na terça-feira que a proposta para reduzir o uso de pesticidas pela metade, considerada crucial para os objetivos de biodiversidade do bloco, seria descartada e reescrita. Este anúncio foi recebido com aplausos no Parlamento Europeu. No mesmo dia, a Comissão também reduziu uma meta teórica para a diminuição das emissões agrícolas do seu plano climático para 2040.
Números a reter
Orçamento anual da Política Agrícola Comum: próximo de €60 mil milhões
Percentagem da população ativa da UE representada por trabalhadores agrícolas: 4%
Aumento das importações agrícolas da Ucrânia de 2021 para 2022: de €7 mil milhões para €13 mil milhões
Fonte: FT
CURTAS
A Procuradoria-Geral da República vai recorrer da decisão do TCIC que impôs medidas cautelares leves ao ex-presidente da Câmara do Funchal, Pedro Calado, e a dois empresários, Avelino Farinha e Custódio Correia, no âmbito de uma investigação por corrupção na Madeira • Visão.
Luís Montenegro, da AD, reagendou o seu debate com o líder da Iniciativa Liberal, Rui Rocha, para domingo na SIC devido a motivos pessoais, mantendo-se os debates com outros líderes nos dias subsequentes • Público.
O Tribunal Constitucional declarou inconstitucionais as normas que impõem limites à atividade de TVDE na Madeira, reafirmando a competência exclusiva da Assembleia da República na matéria • Lusa.
Os agricultores portugueses começarão a receber, ainda este mês, os pagamentos dos ecorregimes após a conclusão de conversações entre o Ministério da Agricultura e a Comissão Europeia • Lusa.
Nicolas Sarkozy foi condenado a seis meses de prisão efetiva por financiamento ilegal da sua campanha presidencial de 2012, tornando-se no primeiro ex-presidente francês condenado à prisão após a Segunda Guerra • Público.
O Presidente egípcio, Abdel Fattah al-Sissi, recebeu o Presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, para uma cimeira no Cairo, numa visita considerada histórica após anos de relações tensas • Sapo 24.
O setor do alojamento turístico em Portugal registou aumentos significativos em hóspedes, dormidas e proveitos em 2023 comparativamente a 2022, com valores superiores também aos de 2019 • Sapo 24.
O número de ataques dos extremistas islâmicos no norte de Moçambique diminuiu 71% em 2023, graças a operações das forças da SADC e do Ruanda, embora muitos deslocados ainda não tenham regressado a suas casas • Sapo 24.
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Um musical
A Madrugada Que Eu Esperava, Teatro Maria Matos, Lisboa, de quarta a sábado às 21h, domingos às 17h, até 28 de Abril 2024. “Carolina Deslandes e Bárbara Tinoco levam-nos ao dia inicial, inteiro e limpo. Carolina Deslandes e Bárbara Tinoco cantam e dançam em coreografias pop, mas não são aqui cantoras, antes actrizes de um musical, interpretando as canções que compuseram para a peça, dando vida ao texto de Hugo Gonçalves – que regressa ao imaginário do 25 de Abril pouco depois de também o fazer no romance Revolução – e ocupando o palco encenado por Ricardo da Rocha (crítico de música clássica do PÚBLICO).” Mário Lopes
Uma exposição
Liberdade. Portugal, lugar de encontros, UCCLA – União das Cidades Capitais de Língua Portuguesa, Lisboa, Av. da Índia, 110; e, a partir de dia 15, Centro Cultural Cabo Verde, Lisboa, Rua de São Bento, 640. Dias úteis, das 10h às 18h, até 10 de Maio 2024. Curadoria: João Pinharanda. “A liberdade de fazer arte em português
A exposição é inesperada, surpreendente, inédita, e convida-nos a pensar de um modo pouco habitual o sucesso de uma revolução que foi diferente de tudo aquilo que a história nos tinha ensinado sobre revoluções.” Luísa Soares de Oliveira
Um livro
Como Morrem as Democracias, de Steven Levitsky e Daniel Ziblatt
Editor: Vogais, 2018. “A presidência de Donald Trump veio levantar uma questão que muitos nunca pensaram colocar: a democracia norte-americana está em perigo? Steven Levitsky e Daniel Ziblatt, ambos professores em Harvard, dedicaram mais de 20 anos ao estudo da queda de democracias na Europa e na América Latina, e acreditam que a resposta para essa pergunta é «sim».”
RELEMBRANDO
Não lemos todas as newsletters todos os dias, naturalmente… Podem ter-lhe escapado estes assuntos:
[1.29] Uma Visão para Além de 2030: Comissão Europeia propõe corte de 90% nas emissões. É um documento com ambição, publicado numa altura delicada: eleições dentro de 4 meses, agricultores nas ruas e partidos conservadores a falar em "radicalismo verde". Mas temos um plano.
[1.28] A entrada da extrema-direita no Governo é praticamente inevitável. A direita deverá o crescimento eleitoral todo ao Chega, o terceiro partido mais votado deste século. Não há desculpas, cenários ou artimanhas para o marginalizar. Nem vontade, na AD.
[1.27] Grande passo atrás para a Europa: Comissão retira proposta de redução de pesticidas. Ursula von der Leyen fez a UE recuar anos numa proposta importante. Está a ser criticada pela cedência aos protestos em ano eleitoral.