[E.8] Potenciais alianças no Médio Oriente em caso de uma guerra aberta entre Israel e Irão
Israel tem um aliado fortíssimo, os EUA, e pouco mais. O Irão tem dois aliados pouco empenhados, Rússia e China, e uma crescente desconfiança do mundo árabe.
O cenário geo-político do Médio Oriente é caracterizado por alianças complexas e rivalidades históricas, com mais de 3.000 anos — na muito breve cronologia que apresento para nos situarmos identificam-se 17 mudanças de grande dimensão, impérios e predomínios culturais, económicos e religiosos.
No centro dessa teia de relações estão Israel e Irão, dois países com objetivos estratégicos opostos, que moldam a dinâmica regional. Este artigo explora as intrincadas alianças no Médio Oriente, analisando como essas relações podem alinhar-se em caso de um conflito declarado entre os dois países. Examinaremos o contexto histórico, as alianças atuais e os potenciais realinhamentos que podem ocorrer numa situação de guerra aberta, considerando os interesses de potências regionais e globais.
Recordo que no primeiro artigo — Médio Oriente sem um plano de paz: nem Netanyahu, nem Pezeshkian, nem Biden — temos o ponto de situação da região, cada vez mais longe de uma rota de pacificação, e onde uma nova geopolítica emerge, enquadrada pelo cisma do Islão.
Este segundo artigo nalguma medida aprofunda e explica a dinâmica regional, ajudando-nos a entender o que podemos esperar dos próximos tempos. Procurei dar um enquadramento mínimo a assuntos complexos, como as forças e fraquezas militares dos dois países. E a situação económica, com a ressalva de que esta é altamente volátil tendo em conta as circunstâncias.
Decidi deixar de fora, por razões de espaço e tempo de leitura, as interpretações políticas, sejam moralistas (que lado tem “razão”), sejam de antecipação (que lado está a ganhar / vai perder). Há sem dúvida campo e espaço para elas, noutras ocasiões.
O que me parece nesta altura, e em síntese, é que à exceção de Benjamin Netanyahu ninguém —e repito: ninguém — tem interesse na escalada do conflito, desde o momento em que ficou claro que Gaza é território morto e a Palestina um Estado desmantelado, sem que as Forças Armadas de Israel, por ele comandadas, tivessem resgatado os reféns ao Hamas, e sendo patente que judeus e israelitas se sentem hoje mais ameaçados, e não menos.
Contudo, há países na região que têm a ganhar se uma guerra direta diminuir a importância do Irão, a qual tem vindo a crescer. Mesmo que não sejam forçados a envolver-se diretamente, o custo da guerra será pesadíssimo para todos. E os riscos são muito grandes. Pelo que as vias diplomáticas e de negociação ainda não estão esgotadas, longe disso.
Índice:
Contexto: uma muito resumida cronologia da mais turbulenta região do mundo
Potenciais alianças no Médio Oriente em caso de uma guerra alargada
Alianças e relações de Israel (militares, políticas e económicas)
Alianças e relações do Irão (militares, políticas e económicas)
Análise de potenciais alinhamentos em caso de conflito Israel-Irão
Alinhamentos conhecidos
Atores potencialmente neutros ou ambíguos
Implicações globais
Considerações regionais
Fatores económicos
As forças e as fraquezas militares de Israel e Irão
A situação económica dos dois países
Contexto: uma muito resumida cronologia da mais turbulenta região do mundo
Primeiras Civilizações (c. 3500 - 1200 a.C.) - Surgimento das civilizações mesopotâmicas (Sumérios, Acádios, Babilónios, Assírios) e do Antigo Egito
Império Persa Aqueménida (550 - 330 a.C.) - Primeiro grande império a unificar grande parte do Médio Oriente
Império Macedónio de Alexandre, o Grande (330 - 323 a.C.) - Conquista rápida do Império Persa e expansão para o leste
Impérios Selêucida e Ptolemaico (323 - 30 a.C.) - Divisão do império de Alexandre entre os seus generais
Império Romano / Bizantino (27 a.C. - 1453 d.C.) - Domínio sobre partes significativas do Médio Oriente
Império Sassânida (224 - 651 d.C.) - Renascimento do poder persa, rival do Império Romano / Bizantino
Cisão entre os seguidores de Maomé (632) – morte do Profeta, que não deixa herdeiro designado, e início do conflito entre sunitas (que alinham com o amigo mais próximo, Abou Bakr) e xiitas (que seguem o genro, Ali)
Califados Islâmicos (632 - 1258 d.C.) - Califado Rashidun, Omíada e Abássida; rápida expansão do Islão e domínio árabe na região
Império Mongol (1206 - 1368 d.C.) - Breve período de dominação mongol em partes do Médio Oriente
Império Otomano (1299 - 1922 d.C.) - Longo período de domínio turco sobre grande parte do Médio Oriente
Império Safávida (1501 - 1736 d.C.) - Domínio persa e estabelecimento do Xiismo como religião oficial no Irão
Colonialismo europeu (séc. XIX - meados do séc. XX) - Influência britânica e francesa na região após o declínio otomano
Formação dos estados modernos (pós-1ª Guerra Mundial) - Criação de novos países após a queda do Império Otomano
Era do petróleo (meados do séc. XX - presente) - Descoberta e exploração de vastas reservas de petróleo, alterando a geopolítica regional
Conflitos árabe-israelitas (1948 - presente) - Criação do Estado de Israel e subsequentes guerras e tensões
Revolução Iraniana (1979) - Queda da monarquia e estabelecimento da República Islâmica do Irão
Guerras do Golfo (1990-1991, 2003-2011) - Conflitos envolvendo o Iraque e potências ocidentais
Primavera árabe (2010 - 2012) - Onda de protestos e revoluções em vários países árabes
Ascensão e queda do Estado Islâmico (2014 - 2019) - Breve período de controlo territorial por grupo extremista
Ataque do Hamas a Israel (7 outubro 2023) - 1.200 cidadãos mortos e 250 capturados pelo grupo terrorista em solo israelita originam o presente conflito
ATUALIDADE
As potenciais alianç temas no Médio Oriente em caso de uma guerra declarada entre Israel e Irão
Desde a fundação do Estado de Israel, em 1948, e sobretudo da revolução xiita no Irão, em 1979, os dois países converteram-se no centro das preocupações políticas e militares, tornando a instabilidade novamente como a principal característica da região que, sem eles, estaria num caminho relativamente tranquilo de prosperidade, apesar de algumas assimetrias na distribuição da riqueza.
Os impérios e potências coloniais que ocuparam a extensa região deixaram um legado de fronteiras contestadas e tensões étnicas e religiosas. A criação do Estado de Israel e os subsequentes conflitos árabe-israelitas alteraram significativamente o equilíbrio de poder na região. A Revolução Islâmica no Irão introduziu outro elemento de instabilidade, criando uma nova potência regional com uma agenda ideológica distinta.
As alianças no Médio Oriente são frequentemente caracterizadas por:
Divisões sectárias: A cisão entre sunitas e xiitas influencia fortemente as alianças regionais, com o Irão a liderar o bloco xiita e países como a Arábia Saudita a liderarem o bloco sunita.
Interesses económicos: Os recursos petrolíferos e as rotas comerciais desempenham um papel crucial na formação de alianças e parcerias económicas.
Influência das potências globais: Os Estados Unidos, a Rússia e, cada vez mais, a China têm interesses estratégicos na região, influenciando as alianças locais.
Conflito israelo-palestiniano: A posição dos países em relação a Israel e à questão palestiniana continua a ser um fator determinante nas relações regionais.
Ameaças comuns: A luta contra o terrorismo e o extremismo tem levado a alianças improváveis e cooperação tática entre antigos rivais.
Nos últimos anos, tem-se assistido a uma reconfiguração das alianças tradicionais. Os Acordos de Abraão de 2020, que normalizaram as relações entre Israel e vários países árabes, marcaram uma mudança significativa na dinâmica regional. Simultaneamente, o Irão tem reforçado a sua influência através do apoio a grupos não estatais em países como o Líbano, o Iraque e o Iémen.
Alianças e relações de Israel
Continue a ler com uma experiência gratuita de 7 dias
Subscreva a VamoLáVer para continuar a ler este post e obtenha 7 dias de acesso gratuito ao arquivo completo de posts.