[1.2] Carneiro vs. Pedro Nuno vs. Adrião: internas incertas no PS pela 3ª vez neste século
Em 2004 Sócrates bateu dois pesos pesados, em 2011 Seguro venceu outro. As incertezas no PS surgem nos fins de ciclo, com batalhas de programas e de personalidades.
Um número cheio de eleições. Começa com uma análise às internas do PS, das quais sairá o tom que vai determinar as legislativas antecipadas de março, numa frase “ceder à direita ou combater a direita”. E prossegue com duas presidenciais em continentes distintos e com sinais opostos: os argentinos decidiram-se por um radical capaz de estoirar com o consenso da América do Sul, enquanto os libérios votaram pela continuidade e pela democracia — e deu-se uma transição pacífica que é rara em África.
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ANÁLISE
José Luís Carneiro, Pedro Nuno Santos ou Daniel Adrião: terceira vez neste século que sucessão no PS é incerta
O PS tem um “combate de chefes” em perspetiva. Não será tão épico quanto o de 2004, em que João Soares, Manuel Alegre e José Sócrates eram cabeças de correntes internas muito diferentes, é mais próximo da disputa de 2011 entre António José Seguro e Francisco Assis. Em nenhumas das outras onze eleições internas isto sucedeu.
Nos próximos dias 15 e 16 de dezembro José Luís Carneiro, Pedro Nuno Santos e Daniel Adrião (por ordem da apresentação de candidaturas) disputam umas eleições de fim de ciclo: um líder sai numa situação de descontinuidade de projeto, deixando em aberto a hipótese de um novo rumo, de uma variação ideológica dentro de um dos dois partidos portugueses com maior democracia interna. Este género de disputa de novos rumos pelas fações internas ainda não tinha ocorrido este século num partido no Governo.
Os contornos da situação são conhecidos: em plena maioria absoluta, o Primeiro-Ministro António Costa é alvo de suspeição judicial (fica de fora desta edição o fundamento dela), fica sem condições políticas para continuar e vê-se forçado a demitir-se. Dois ministros dos governos Costa avançam com candidaturas que, dadas essas circunstâncias forçadas, não se ajustam facilmente na tipologia das eleições internas partidárias, como veremos a seguir. Pedro Nuno Santos já era proto-candidato, em José Luís Carneiro a ambição não era imediatamente visível. Daniel Adrião é o “repetente”, avançando pela quarta vez com uma candidatura que cumpre uma lógica diferente das outras duas.
As eleições internas dos partidos dividem-se em quatro tipos. Um deles é o dos partidos novos, em que a indefinição e o desconhecimento das figuras e dos projetos permitem esperar tudo. Exemplos? PAN, Livre e IL. Um segundo é próprio dos partidos estáveis em que a sucessão é sempre combinada em conversações internas opacas para o cidadão antes de ser legitimada pelo voto em sessões solenes, com ou sem candidatos a dar brilho à democracia. Exemplos? CDS e PCP.
Os outros dois tipos só aparecem nos dois maiores partidos que têm vencido as eleições em Portugal. PSD e PS são semelhantes nisto: umas eleições são do tipo incerto, outras são do tipo sucessão. O ato eleitoral em curso pertence ao tipo incerto e é a terceira vez que isto sucede no partido nos últimos 25 anos (vê lista abaixo).
As eleições do tipo sucessão acontecem invariavelmente quando um destes partidos está no Governo. Ao contrário, as eleições do tipo incerto são frequentes quando se está na oposição, ou seja, se perderam sucessivas batalhas eleitorais, como é o caso, este século, do PSD, que vai no seu oitavo presidente em 25 anos (o PS vai no quinto).
Durão Barroso era Primeiro Ministro quando deixou o partido (e o governo) a Santana Lopes para ir presidir à Comissão Europeia, tal como António Guterres, que se demite após uma derrota eleitoral e lhe sucede Ferro Rodrigues, em ambos os casos sem disputa por fações internas. A atual demissão de António Costa é diferente, é a primeira do género e talvez por isso proporciona umas internas típicas de fim de ciclo.
Esta cronologia do poder explica porque razão o PS tem as suas terceiras eleições internas incertas a marcar o fim do seu terceiro ciclo este século enquanto o PSD teve oito eleições incertas (ver lista abaixo).
Eleições desde 1999: PS
1999 (16/01) - António Guterres 96,65%
2001 (22/04) - António Guterres 96,19% contra Henrique Neto e António Brotas
2002 (19/01) - Eduardo Ferro Rodrigues 96,45% dos votos ( Convenção Nacional para eleger SG após a saída de António Guterres). Eleição ratificada no XIII Congresso de Novembro seguinte com 1198 votos de um universo de 1492 delegados
» 2004 (25/09) - José Sócrates 80,07% contra Manuel Alegre (26,8%) e João Soares (1,5%)
2006 (28/10) - José Sócrates 96,82%
2009 (14/02) - José Sócrates 94,44% contra António Fonseca Ferreira e António Brotas
2011 (26/03) - José Sócrates 93,3%
» 2011 (22/11) - António José Seguro 67,98% contra Francisco Assis (32,02%)
2013 (13/04) - António José Seguro 92,71% contra Aires Pedro
2014 (22/11) - António Costa 96%
2016 (21/05) - António Costa 95,3% contra Daniel Adrião (2,8%)
2018 (12/05) - António Costa 93,33% contra Daniel Adrião (4,55%)
2021 (19/06) - António Costa 94% contra Daniel Adrião (6%)
Presente - José Luís Carneiro, Pedro Nuno Santos, Daniel Adrião
Eleições internas no PSD
2005 - Luís Marques Mendes vences Luís Filipe Menezes por diferença de 12%
2007 - Repete-se o confronto e é Menezes que vence desta vez por margem menor, 10%
2008 - Manuela Ferreira Leite (37%) vence Pedro Passos Coelho (31%) e Pedro Santana Lopes (29%) no “combate do século”
2010 - Pedro Passos Coelho vence Paulo Rangel, 61% contra 34%, vai ser Governo e presidir ao partido por oito anos
2018 - Rui Rio bate Santana por 54% contra 45%
2020 - Rui Rio vence Luís Montenegro encurtando a margem, 52% contra 46%
2021 - Rio vence Paulo Rangel por uma unha, 51% contra 46%
2022 - Luís Montenegro vence Jorge Moreira da Silva por 71% contra 27%, a melhor margem do século no confronto de menor impacto (e apenas 27.000 votos nas “diretas”)
Fontes: PS, PSD
ELEIÇÕES
🇦🇷😮 Argentina elege presidente um negacionista, libertário e radical de direita
Javier Milei emergiu como o vencedor provisório das eleições presidenciais da Argentina, inclinando o país para a direita com uma campanha estridente anti-establishment, comparável à de Trump, isto no meio a uma das mais altas taxas de inflação do mundo.
Milei é um negacionista do clima, que considera uma “invenção da esquerda”, entre outros indicadores de uma loucura desalinhada com a realidade e a ciência. É uma figura controversa, radical de direita e libertária.
Na primeira entrevista reafirmou que vai fechar o Banco Central da Argentina e “dolarizar” a economia.
Impacto na Política Externa: O triunfo de Milei pode significar uma reorientação da política externa argentina, potencialmente afastando-se do tradicional alinhamento com governos de esquerda na região
Relações com a União Europeia: A União Europeia poderá ter de recalibrar as suas relações com a Argentina, o que poderá afetar acordos comerciais, discussões sobre alterações climáticas e cooperação no âmbito das políticas de direitos humanos
A onda conservadora na América Latina: Esta vitória de Milei poderá inspirar movimentos políticos de direita em outros países latino-americanos, repercutindo-se nas dinâmicas políticas internas da União Europeia, que tem seguido de perto as tendências políticas do subcontinente.
🇱🇷🔄 Presidente aos 78 anos: Joseph Boakai herda pacificamente uma Libéria menos tensa
Joseph Boakai, com 78 anos, foi eleito presidente da Libéria, tornando-se o terceiro chefe de Estado democraticamente eleito do país. O ex-vice-presidente sob o mandato de Ellen Johnson Sirleaf obteve a sua revanche contra o presidente George Weah, que o havia derrotado em 2018.
Weah demonstrou fair play ao conceder a eleição pacificamente antes do anúncio final dos resultados — precedente importante para a região, que tem enfrentado diversos golpes militares nos últimos anos.
As transições pacíficas de poder permanecem relativamente raras em todo o continente: Apesar de oferecer até $5 milhões a líderes africanos que deixam o poder quando seu mandato termina, o Prémio Ibrahim, criado por um bilionário sudanês, só foi reivindicado sete vezes desde sua criação, há 16 anos (tal como Nelson Mandela, o moçambicano Joaquim Chissano foi um dos premiados).
Trata-se apenas da segunda transição democrática pacífica em mais de sete décadas na Libéria, rendendo-lhe elogios em todo o espectro político e amenizando as tensões num país conhecido pela volatilidade.
Apelidado de "Sleepy Joe" por adormecer em eventos públicos, Boakai procurou reformular sua imagem, apresentando-se como um homem do povo com um passado modesto. Apesar das preocupações de estar desconectado da juventude num país onde 60% da população tem menos de 25 anos, os seus apoiantes realçam sua integridade e a promessa de combater a corrupção e investir nas infraestruturas do país para reduzir a pobreza extrema.
A reter
Joseph Boakai é eleito presidente da Libéria aos 78 anos, sucedendo a George Weah
Os seus apoiantes enaltecem a sua experiência e integridade, enquanto os críticos questionam a sua falta de ligação com a juventude
Compromete-se a lutar contra a corrupção e a investir em infraestrutura para aliviar a pobreza
Boakai tem o apoio dos eleitores mais velhos e valoriza a estabilidade política
Os EUA congratularam Boakai pelo triunfo e Weah pela transferência de poder pacífica (a Libéria é um dos dois únicos países da África Subsaariana sem raízes na colonização europeia mas sim nos escravos americanos).
Fontes: Mo Ibrahim Foundation, France 24
CURTAS
BERLIM - A adesão da Ucrânia significaria o fim do sistema agrícola da UE, avisa a união dos agricultores alemães. A entrada daquele potentado agrícola resultaria na “morte” da agricultura familiar. A nota vem somar-se às crescentes preocupações sobre a direção futura do programa de subsídios agrícolas da UE. • Euractiv
ENERGIA - Bicicletas e triciclos elétricos contribuem mais para a redução de emissões do que automóveis elétricos, com 280 milhões em circulação, contra 20 milhões de carros elétricos. Análise revela que e-bikes diminuíram a procura de petróleo em um milhão de barris diários. • The Conversation
PARIS - Em reunião na abadia de Saint-Denis, o Presidente Emmanuel Macron e líderes partidários falharam um consenso para um referendo sobre imigração, dada a ausência de apoio e a complexidade da reforma constitucional necessária. Jordan Bardella do RN foi a exceção, apoiando o projeto. • Le Monde
KIEV - Segundo previsões da Comissão Europeia, publicadas no seu site, espera-se que a economia ucraniana cresça 3,7% em 2024 e 6,1% em 2025, mostrando resiliência apesar da invasão russa. • UKRInform
LUANDA - A Assembleia Nacional de Angola aprovou na generalidade o Orçamento Geral do Estado para 2024, com 111 votos a favor e 74 contra, sem abstenções. A proposta inclui um aumento salarial de 5% na função pública, receitas e despesas de 24 biliões de Kwanzas e prevê o crescimento económico de 2,8%, com destaque para o setor não petrolífero. O orçamento foca-se na redução das desigualdades sociais e proteção do rendimento das famílias. • Angop
UE - A Comissão Europeia propôs na semana passada um novo conjunto de sanções contra a Rússia. Se aprovado por todos os estados-membros da UE, este será o 12º pacote desde o início da invasão em larga escala da Ucrânia pela Rússia. O elemento mais importante do pacote é a proibição de diamantes russos (que os EUA já fizeram). O pacote também endurecerá outras medidas, como o limite de preço do petróleo e restringirá as importações de GPL russo. • Politico